Vi avistarem o sol com a rua prateada

por onde passavam carros também prateados

o asfalto era uma forma de construção

e as rodas ferviam no chão quente

pessoas caminhavam desesperadas

e o desespero era calor que não se atenuava

por mais que gritos ecoassem das avenidas

havia um tremor nas cabeças descompassadas

fieis carregavam cruzes e enfeites de devoção

os hereges blasfemavam contra o poder das autoridades

era cínico o badalar de dentes na cidade

o medo piorava a cada vão momento

e as trevas dos concessionários pediam mais automóveis

para entupir as luas de um espaço sem ascensão

favelas e suas nuvens embriagavam de poluição

o ar remoto sem controle piorava radicalmente

o mar não serenava na praia do pânico

cada lugar que via era penumbra

hasteando as bandeiras da ferocidade

o manto da discórdia cobria os leigos

e as mãos ocultas do prazer

acariciavam a sabedoria dos lacaios

fazia parte de todo mês de maio

se entristecer sozinho num alvo pálido

e atirar as flechas em busca de harmonia