Quilates mas não mordem

Vou contar os dedos das mãos

como quem desfolha seus quilates

forjando seus anéis incrustados

procuro remover com álcool os desgastes

que tingem a mente de preocupação

vou dourar a ouro minha alquimia

que é destilar segredos ilusórios

vou remover as pestes públicas

pra não andar na multidão

sonhando acordado

vou bocejar vagarosamente

e flambar as labaredas da visão

olhar com doçura meus critérios

meus créditos de devoção

assim pretendo desposar maciez infindável

e não cair no peso das armadilhas

que criam embalagens frágeis

vou abrandar o teor cético

das minhas peripécias divinas

falar em tom raquítico

que pretendo lapidar minha estrutura

minha cartilagem óssea

tem motivos de sobra

pra não se assombrar com corpos

que aglutinam lamentações

Sem títulos

1

Uma selva de lâminas

acariciava os arbustos

que pequenos dilaceravam muitos

era de se espantar o tamanho dos sustos

que coléricos difamavam os outros

nas entrelinhas de um arvoredo

se via escondida a pequenez atroz

que consumia a grandeza de poucos

era notório o calcular de preces graúdas

que afastariam os desfalques e fobias

pra que gestos servissem de alento

era preciso mais que contentamento

era preciso que a proteção dos cômicos

limpasse o humor de seus assoalhos

e não pisasse no gramado da seriedade

era preciso nostalgia em forma de criança

pra que na infância o amor  restituísse a saudade

nos vínculos que unem veículos

estão unidas as lembranças motoras

ninguém esquece de estacionar mais tarde

uma guerra de seda tremula

não espanta dos olhos a leveza

e não deixa de fazer voar a libélula

que esbanja em seu pouso a certeza

que seremos felizes pra sempre

uma serra que corta a cerca

nunca mais prenderá infortúnios

e não salgará o mel das abelhas

pra que mude de gosto a tristeza

que um dia se transformará

em luxúria previa da alegria

pra que num hibernar de luzes

nunca se apague a euforia

é sabedoria absoluta se embrenhar em via

espantar as ruas da agonia

e tilintar pelas mais belas avenidas

uma trégua as campinas

que verdes não amadurecem seus conselhos

e se entregam ao rústico patrimônio das intrigas

devemos espelhar nossos reflexos na montanha

e avistar a serra que se condensa diante das maravilhas

2

Em meio à sombras delirantes

a carniça debruçava suas lastimas

a cabeça debruçava ameaças

e o  ombro dissecava-se nas matas

era lisonjeiro o açoitar de corpos

ruminando a esmo

e as incógnitas do tempo

diziam que o amor estava em pedaços

ninguém morria de fato nos campos

ninguém entoava um só pranto

e chorava órbitas e desenganos

era de derramar vitórias

cada gota ininterrupta de fracasso

e a derrota perpetuava nos corações

onde o homem passava horas a fio

num compasso intrigante de idéias

e os tecidos rígidos da lisonja

interrompiam as mortes súbitas

quando havia ainda ar para respirar

os trajetos emoldurados da ira

ofuscavam o sol nascente

e declinavam o poente

eram lindas as cóleras do mundo

as feras gananciosas do lirismo

onde os poetas sanavam dores

e declamavam seus amores

troféus do exílio coletivo

e dos pecados aflitivos

nas selvas intrínsecas do desperdício

haviam ainda almas variando sonhos

catalogando adornos

desperdiçando vidas

e as nuances dos mortos eram obras

intermináveis que não cessavam

formas tetraplégicas de consumo

arquétipos de insensatez e loucura

em meio à câimbras e avarezas

o monstro da fartura devorava decência

e construía uma sociedade arrogante

formada por cartas na manga

trapaça e um punhado de avareza

no fim tudo era incerto e colibri

voando perto da tristeza

Desabafos sustentáveis

Unindo a haste perfeita

me sinto famigerado ao extremo

como se estivesse no paraíso

fugindo de meus problemas

tento curtir melhores acalantos

e nunca me perder dos guizos

pois eles me fazem recordar

que cada serpente é um antro

de perdição a ser esquecido

nos semblantes mais larvais

encontro a origem dos meus nervos

explícitos e navais

eles empurram as embarcações

e deixam as âncoras para trás

nos barcos há uma proa que separa

toda discórdia que se arrasta

e deixa os marujos indefiníveis

acompanhados de restos

que querem ser reconhecidos

e não cria máquinas

que se alojam nas arestas do desperdício

mesmo nos momentos de calibrar compromisso

eu respiro com tamanho alivio

nenhuma praga pode açoitar pêlos

que se soltam dos signos animalescos

pois eles têm a garra de decifrar o futuro

e não são como fantasias de carrascos

a ignorar a formula e o soro

que podem curar o mal

toda presa culpa o predador por sua fraqueza

mas não é de se espantar que no mundo

ainda existam troféus de beleza

no paraíso volto a dizer

me sinto como quem foge dos resíduos

que tornam perecíveis as virtudes

sou um rapaz assíduo

mas nunca cavo o fundo do poço

com os mesmos tratores

nem mesmo escravizo personagens e atores

que sejam eles reais, fictícios

ou semelhança entre meus humores

prefiro rir ao gozar de meus atrevidos horrores

Zonas restritas

Trafego em zonas restritas

e meu âmago atropela enfadonhos

que se cansam de atravessar estradas

dobro esquina como quem amassa papel

e não se importa com as vias

simplesmente se enxota

quando dá  sinal de repudia

e evita  qualquer atmosfera

da mais bela e condizente

ao mais lindo continente

se me expulsam dos trópicos

tento criar expectativas

que não atrofiem termômetros

que deixem o suor escorrer com facilidade

e que permitam a sensibilidade suavizar o inimigo

como arranjos de pétalas no limbo

sem se importarem com a direção

se os lírios desabrocharam na estação

ou se petúnias calaram odores perturbadores

nas lacunas de meus ouvidos

tento escutar o perfume dos lábios

a voz doce de uma rápida amnésia

com o extinto de esquecer os temores

e lembrar das mais trepidas emoções

dirijo meus pensamentos em alvuras coletivas

repudiando blasfêmias e tolices

e coletando cálices de barítonos

pra que um dia eles cantem suavemente

e façam remoer amores em meus tímpanos

e assim eu ouça os meus gritos

acolhedores nas réplicas dos calouros

que levarão carvões a grandeza dos diamantes

para que mais tarde possam extrair de suas lições

aprendizes de professores

Realce

Derradeiras crises existenciais

começam a me causar introspecções

e introvertido não consigo me localizar

por isso dou um salto instantâneo

e mudo de figura alegrando meu semblante

no cume das minhas vísceras

faço questão de alcançar o topo dos trevos

e realçar a sorte que tanto me afortunou um dia

cordas se afrouxam no meu colo

e entro com os ventres à flor da pele

renascendo das cinzas e sentido as rosas

deslizarem suavemente pelo meu braço

a cotovia canta enquanto as luzes do meu solo

regem a penumbra para que ela se torne lua

e as portas do meu lustre individual abrem

e fazem a felicidade dourar e durar

começo a dirigir sobre veículos que sorriem

e sabem a hora oportuna de estacionar

nenhum carro em transição me aprisionará

se um retirante do transito me para

eu grito e afasto esse tédio eminente

não quero as crises a me rondar no asfalto

pisar no acelerador da pressa e não pensar

isso me conduzirá ao fracasso

quero sentir o aroma viril das frases de impacto

sentir as crases me acentuarem de fato

me assentar nas bases e comprovar os atos

como prova eu tiro retratos

e averiguo cada cacto sensato

para que eu não me comprometa com espinhos

e sinta sim o frescor concreto dos cravos

e me delicie como lebres da fertilidade

buscando a fortuna e a liberdade

Metrópole

Vi avistarem o sol com a rua prateada

por onde passavam carros também prateados

o asfalto era uma forma de construção

e as rodas ferviam no chão quente

pessoas caminhavam desesperadas

e o desespero era calor que não se atenuava

por mais que gritos ecoassem das avenidas

havia um tremor nas cabeças descompassadas

fieis carregavam cruzes e enfeites de devoção

os hereges blasfemavam contra o poder das autoridades

era cínico o badalar de dentes na cidade

o medo piorava a cada vão momento

e as trevas dos concessionários pediam mais automóveis

para entupir as luas de um espaço sem ascensão

favelas e suas nuvens embriagavam de poluição

o ar remoto sem controle piorava radicalmente

o mar não serenava na praia do pânico

cada lugar que via era penumbra

hasteando as bandeiras da ferocidade

o manto da discórdia cobria os leigos

e as mãos ocultas do prazer

acariciavam a sabedoria dos lacaios

fazia parte de todo mês de maio

se entristecer sozinho num alvo pálido

e atirar as flechas em busca de harmonia