Táxi uivar

Jurei manter em gritos meus sonhos
afogar a venda de meus eventos
surrupiar agenda de meus segredos
é meio termo que treme
nesses dias dilacerados
é noite que desnorteia
nesse inverno invertido
procuro a uruca de minha cuca
a túnica lúdica das fumaças
é com a pudica lira crônica
que a súplica leva surra
mas não aguento muito veneno
a laboriosa chibata
agonizante dentro de meu ventre
e sobre os uivos de meu tórax
um táxi conduz os lobos
ao estacionamento das alcateias
é lá que devem ficar as feras
longe de minhas tabernas

Algazarras e Gramáticas

Travas nas línguas que não têm muito a dizer

que definham letras , palavras e sílabas

há um gotejar de vogais minimalistas

no paladar que dita consoantes

ninguém está a salvo da gramática

ninguém corre para longe

quando o acento é mais soturno

o dia desperta seus laços

e une um emaranhado de fissuras

que não se corrigem

nem mesmo em clínicas orais

trevas travam o celeste silenciar

daqueles que já falaram muito

mas o céu não tem lugar pra mudos

nem mesmo pra quem não escuta

o cintilar da lousa áspera e fria

não há caminho para os surdos

não há intervenção para a ausência

de todos os sentidos

quando tolos estão fadados

a se aventurar em hospícios

o que escuto são gemidos

e pingos de pavor caídos no chão

pausas momentâneas são semáforos

sinais de ausência e movimento

farejo meu esquema tátil

e apalpo minhas mãos calejadas

surradas de sufoco e desavenças

brasas não pisam em seu fogaréu

servem de escravas e réu

de toda brisa que passa

e atrofiam semblantes camaradas

que da vida não fazem mais nada

Duas folhas

Dois tipos de folhas me questionam

a folha do caderno que ergue palavras

e serve pra identificar sonhos

e a folha de um outono que seca

e definha quando o dilema é a guerra

com mãos em punho escrevo poesias

deixo a imaginação e a real compostura

fluírem sem nenhuma flecha

a atingir com quedas múltiplas a dor

já a estação das rugas e do cansaço

viu o tempo passar

e hoje já não tem nem força pra falar

comprimida de ideais esquecidos

perdeu seus encantos mais fortes

e hoje canta com a agonia dos mortos

e sem o calor dos trópicos

temos que iluminar nossos dias

resgatando a robustez da primeira folha

daquela que enxotou os conchavos alheios

e que pensou em suas próprias conquistas

temos que entoar cantigas de acordar

e não ninar pensando na próxima estação

o outono já se preparou para o inverno

sente o ardor gélido remoer suas entranhas

temos que lapidar nossas façanhas

e não cair no conto do vigário incrédulo

nem acreditar que somos adeptos

de um vilarejo seco de emoções

e gotas que não choram

os virtuosos derramam prantos de glória

e não inundam os lares de alegria cativa

que cai sempre na mesma rotina

como gatos atrás de um novelo de lã

temos que ser valsa

e não falsos em nossas cantigas

Poema 1

Ordem desmerecendo confusão

fases abruptas de frases ignotas

individualizando a rebeldia

de um emaranhado de cafajestes

desmemoriados em seus requintes

mais aloucados em seus disquetes

é momento de arrumar as gavetas

e separar as flores do jardim

de colocar nas brisas o meio

que irá solidificar o fim

não deixar pra amanhã

o que se pode fazer hoje

e aloirar as encostas do sol

antes que fagulhas da esperança

se tornem pó

lágrimas nunca molham o arco-íris

simplesmente colorem a água

trazendo resquícios de cor para chuva

e acalmando as tempestades

ordem desmerecendo bagunça

ouça o que os meninos dizem

que no colo do jovem calmo

nunca haverá cólicas de maldade

mas sabedoria e maturidade

em órbitas cintilantes

Poesias de antonio luis

1

Uma batolada de incidentes precários
não virá servir de subterfúgio a escassez
ao dilúvio mediúnico que há de captar
em auroras enevoadas meu silêncio
amiúde conquistarei sopros cartesianos
e a mim vou implantar o soro da cura
para que possa redimir meus fracassos
e acender o cetim no feitiche das bigornas
gerando leveza invés de lugares pesados
um entulho fará varreduras em meus brônquios
e trará frescores a minha órbita cintilante
todo ar que respira tem um lar
e assim vou morar aliviado e menos tenso
sem perder o senso do exímio
pois não quero bancar o ridículo em meu veio
no seio da terra que me cria particularidades
haverão partículas de um bem querer amoroso
lá impostarei a voz para ecoar nas grutas
e me sentir em casa devastando horizontes
nas partituras dos meus sustenidos
darei um tiroteio mensal aos meus gritos
mas um tiro de flores a lavar a alma
com cheiro de canções encantarei meus pulsos
e a serviço dos brilhos do sol
luzirei sobre as chamas iluminadas do amor
é bonita cada virgula que se torna ponto
a exclamar suas afinadas indagações
me lamuriar não está nos meus planos cerebrais
mas está nos momentos arejados em que uso a mente
a mente dos cobertores a me socorrer
a trazer conforto para todo o meu corpo
e a esquentar como viseira os cílios
mais perturbadores e insones
agora acordo para as idas e vindas do espírito
que elas não tentem medrar minha carcaça puritana
mas que tentem tornar obra os restos da sobra
sobra embutida em um criado mudo
que se torna servo liberto e fala palavras doces
a beleza do mundo está em saber o gosto e o gesto
e não em se atenuar ao custo e ao vélcro das incertezas
nem ao sustos dos absurdos e dos mestres inglórios

2

Câimbras paralisam o conchavo

que existe entre beatos de pouca fé

começam a formigar os membros

os membros de uma sociedade anestesiada

pela falta de bom senso

ninguém está radiante de alegria

todos estão fadados ao esquecimento

desmemoriados pelas fúrias constantes

ovacionados pela estirpe da tolice

juras de pavor não param de vaiar

e os aplausos se tornam puros mitos

samambaias estão a deriva nos castelos

as plantas começam a murchar de desespero

enquanto as flores perdem seu cheiro

e os sábios esquecem das glórias errantes

não existe viva alma no semblante do poço

todos esquecem de afundar no interior

no interior de suas emoções

e acabam por prestigiar falsos abismos

e não conseguem mudar de vida uterina

se perdem no muro de suas origens

e castram o orgulho fétido da felina

que não rasteja mais atrás de sua presa

tampas de bueiro fecham realizações

o esgoto não será banido das vidas reprimidas

e o amor será alvo de vandalismo

quando as portas do mundo forem extraditadas

como bagagens sem valor próprio

lâmpadas escravizam a luz dos olhos

apagam a realidade

transformando velas em dejetos artificiais

devemos iluminar os brasões da hospitalidade

e não passar o rastelo no solo da infertilidade

Não teve

Meu mundo não teve Guerra Santa
nem serra elétrica
nem Hora do espanto
nem Flora da Holanda

Meu mundo não teve freira na Biblía
férias na Índia
nem Olímpiadas

Meu mundo só teve você
você, você

Meu mundo não teve Beira de Rio
leia um livro
nem cometa no céu

Meu mundo só teve você
você, você

Meu mundo não teve cabeça de indio
aconteça no frio
começa no amanhecer

só teve você
você, você

Meu mundo não teve
hoje, agora, felicidade, tudo bem
só eu e você, você, você

Antonio Luis Neto